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Não sabe o que cozinhar? Vá à feira (ou faça este ensopado de grão-de-bico e leite de coco)

ensopado de grão de bico com leite de coco

Gosto de deixar a feira dizer o que eu vou comer. Chegar sem ideias e voltar com um ingrediente que vira o ponto de partida para colocar em prática uma receita que eu já tinha visto ou comido em algum lugar — talvez em casa mesmo. Ou ainda pedir dicas ao feirante: como faz? Foi assim que nasceu este ensopado de grão-de-bico.

Ajuda ter perto de casa uma feirinha de orgânicos como a do Parque da Água Branca. Foi lá que me apaixonei por um gengibre com folhas, bonito que só, e lembrei de um ensopado de grão-de-bico com leite de coco que eu tinha cobiçado no The New York Times.  Principalmente depois de ler um especial do jornal sobre alimentação e mudanças climáticas e concluir que quero mesmo diminuir a quantidade de carne na minha dieta (só um dado: a pecuária é responsável por 14.5% da emissão anual de gases do efeito estufa, mais ou menos o mesmo percentual de todos os carros, caminhões, aviões e navios; vale ler o especial). 

Grão-de-bico, eu já tinha em casa, daquele que vem cozido. Tenho uma queda por esse ingrediente. Só o nome já é uma delícia. Tão literal: o grão que tem um bico, ora! 

A receita pedia também cúrcuma (açafrão-da-terra) em pó, mas ali na feira havia açafrão-da-terra fresco, como não aproveitar? Juntei também o caruru, uma PANC (planta alimentícia não convencional) que eu nunca tinha preparado, mas comprei depois de um papo com o produtor — no prato original, pedia-se acelga ou couve.

Mais uma mudança: em vez de leite de coco de latinha, fui de leite de coco caseiro, bem mais gostoso. E fácil de preparar, se você conseguir comprar o coco já sem casca.

No fim, acho que deu um samba. E um prato gostoso para vegetarianos e onívoros.

Receita

Ingredientes

  • 1 xícara de polpa de coco seco em pedaços
  • Azeite
  • 1 cebola
  • 4 dentes de alho
  • 1 pedaço de uns 2 cm de gengibre
  • 500 g de grão-de-bico cozido
  • 1 pedaço de 1 cm de cúrcuma
  • 1 punhado grande de caruru (ou acelga ou couve ou outra verdura da sua preferência)
  • ½ limão
  • Pimenta-vermelha em flocos
  • Pão sírio (para acompanhar)

Modo de preparo

  1. Prepare o leite de coco: coloque a polpa no processador ou no liquidificador e cubra com água. Bata, depois passe por uma peneira ou pano de algodão, deixando o leite escorrer em uma vasilha.
  2. Refogue em bastante azeite a cebola picada, depois o alho picado e o gengibre ralado (você pode descascar o gengibre raspando com uma colher e ralar raspando com as pontas de um garfo).
  3. Acrescente o grão-de-bico, um pouco de cúrcuma fresca ralada, sal e pimenta-do-reino. Refogue alguns minutos, até começar a escurecer e grudar no fundo.
  4. Retire da panela uma xícara de grão-de-bico e reserve.
  5. Acrescente na panela uma xícara de leite de coco e 1 xícara de água.
  6. Cozinhe, misturando de vez em quando e raspando as crostas saborosas grudadas no fundo, até o grão-de-bico ficar bem macio e o ensopado engrossar. Se preciso, acrescente mais líquido para dar tempo para os grãos amolecerem. Aproveite também para esmagá-los com o fundo de uma espátula.
  7. Junte um punhado de caruru ou outra verdura cortada em pedaços e cozinhe um pouco mais.
  8. Acerte o sal e acrescente o suco de 1/2 limão.
  9. Na hora de servir, coloque por cima os grãos-de-bico inteiros que tinham sido reservados.
  10. Espalhe também algumas folhas frescas (caruru mesmo ou alguma erva de sua preferência), flocos de pimenta-vermelha e um fio de azeite.
  11. Sirva com torradinha de pão sírio.

Outras receitas com grão-de-bico:

Para cozinhar mais:

Capa do Livro Cozinha de Vó - Mariana Weber - Superinteressante

Comida de vó: bardana com shoyu e pimenta

O Projeto Mesa da Vó entrou em cozinhas paulistanas de diversas origens. Uma delas é a de Hideko, filha de japoneses que vieram ao Brasil para trabalhar na lavoura de café – e avó da chef confeiteira Carolina Iwai, da Amma Chocolate

Hideko preparando bardana

Fotos:  Potyra Tamoyos / The Soul Kitchen Project

Hideko Oda Furuyama, 88 anos, fala pouco. Sentada diante da câmera, responde com sorrisos e poucas palavras às perguntas sobre a infância, os pratos preferidos, a cultura japonesa. Algumas vezes hesita, sem jeito: “Não lembro bem”. Até que se levanta para preparar bardana. Em pé diante do fogão, tem movimentos precisos, postura ereta, segurança ao dosar temperos e explicar procedimentos. Enquanto os ingredientes giram na panela, começam a fluir histórias: a chegada dos pais ao Brasil, ainda adolescentes, vindos do Japão para trabalhar em cafezais paulistas; as caminhadas de dezenas de quilômetros até sítios de amigos; os lanches de bolinho de arroz e omelete levados nos passeios.

É assim, em torno da comida, que rodam as histórias do projeto Mesa da Vó. Na série de almoços promovidos no Soul Kitchen Lab, em São Paulo, sabores e gestos buscam o tempo perdido na memória. E ajudam a preservá-lo. Atrás de Hideko, por exemplo, está, atenta, orgulhosa, a neta Carolina Iwai, chef confeiteira da Amma Chocolate. Foi ela quem indicou a avó a participar do projeto. E é ela quem discorre sobre o que torna comida de vó algo especial: “É a preocupação, o amor de quem está sempre pensando: você vai passar fome? Não pode passar fome!’”.

Esse cuidado se traduzia, por exemplo, nos bentôs de onigiri (bolinho de arroz) acompanhado de tempurá, omelete ou salsicha que a avó fazia questão de preparar para as netas quando iam passear na rua 25 de Março. Se traduz também na atenção ao preparar suas especialidades, como a bardana com shoyu que parentes tentam repetir mas não conseguem fazer igual. Outro favorito da família é a feijoada.

Como tantos outros imigrantes e descendentes, Hideko cozinha com elementos daqui e de lá. Seu caderno de receitas, com pratos bem brasileiros, como pão de mandioca, bolo de fubá e rocambole salgado, divide espaço com uma edição de 1953 do livro Dona Benta. Mas ela faz também um manju (bolinho de feijão doce) que coloca um sorriso no rosto da neta confeiteira.

Hideko com o livro Dona Benta

Hideko aprendeu com a mãe os pratos brasileiros. Esta, não teve opção a não ser se adaptar aos costumes da nova terra. Chegou ao Brasil aos 16 anos, com um casal de vizinhos que, sem filhos, obteve a autorização da família da moça para levá-la com eles. “Minha mãe aprendeu mais comida brasileira, porque mesmo se quisesse fazer comida japonesa não tinha o tempero e as outras coisas de que precisava”, diz Hideko. Mais do que a falta de matéria-prima, havia a barreira da língua. “Como não sabia português, quando queria um ovo, uma galinha, uma verdura, ela nem tinha como falar.”

Mesmo a bardana que hoje é especialidade de Hideko nem sempre esteve à mão. “Antigamente era difícil ter, só depois que a gente passou a comprar semente e plantar.” Agora, a bardana vem do mercado mesmo, geralmente do bairro da Liberdade. Entra em uma receita simples, mas de sabor rico e textura crocante. O pulo do gato está em deixar o vegetal de molho em água antes do preparo, para o caldo não escurecer. E em ter a boa mãe de Hideko, que faz tudo no olhômetro, sem anotar as quantidades.

RECEITA

Bardana com shoyu

Ingredientes
Bardana
Óleo de girassol
Shoyu
Açúcar
Pimenta dedo-de-moça

Modo de preparo
Raspe a película que envolve as bardanas e coloque-as imediatamente de molho em água.

Corte a bardana em tiras finas – você pode usar um ralador ou  descascador para fazer isso.

Aqueça um pouco de óleo em uma panela e jogue a bardana. Em seguida, adicione o shoyu, um pouco de açúcar. Mexa, experimente e, se preciso, acerto o sal. Adicione a pimenta bem picada.

Mexa até que a bardana esteja cozida, mas ainda crocante.

A chef confeiteira Carolina com a avó Hideko
A chef confeiteira Carolina com a avó Hideko

Leia também:

Mesa da Vó: o bolonhesa da nonna Maria Alessandra

Mesa da Vó: a coalhada de Edma

Mesa da Vó
A cada edição do Mesa da Vó, uma cozinheira foi convidada a servir para parentes, amigos e clientes pagantes as especialidades que costuma fazer para a família. As histórias contadas durante o evento e em conversas na casa da convidada abastecem vídeos e textos produzidos em parceria entre o Soul Kitchen e o site O Caderno de Receitas.

Fusilli com brócolis, alho e parmesão: jantar com sabor e sem enrosco

Receita de macarrão com brócolis, alho e parmesão - O Caderno de Receitas

Texto rápido para um jantar rápido. Porque a vida às vezes enrosca, e a gente precisa de soluções fáceis para desenroscar. Fáceis e saborosas, porque o enrosco não pode tirar a graça do dia. Se saudáveis, ainda melhor.

Então em dia de enrosco, véspera de viagem, filho à espera do jantar e nada preparado, abro a geladeira e encontro brócolis. Há também alho, azeite, parmesão, fusilli. Pronto, faria macarrão parafuso com molho de brócolis para desenroscar.

Em uma busca rápida na internet, encontrei no site Serious Eats a dica que fez diferença neste prato simples, simples: usar a água do cozimento do macarrão e do brócolis, cheia de amido, para criar uma emulsão com o queijo e conseguir um resultado cremoso. Segui a receita de lá, com algumas adaptações, e compartilho aqui.

Ingredientes
Brócolis
Sal
Fusilli (ou outra massa)
Azeite
Alho
Parmesão
Pimenta-do-reino
Pimenta vermelha em pó ou em flocos (opcional)

Modo de preparo

1. Coloque água com sal para ferver.

2. Corte o brócolis em pedaços amigáveis para uma garfada.

3. Cozinhe o brócolis na água fervente até amaciar, depois retire-o com uma escumadeira e reserve.

4. Coloque a massa na água usada no brócolis. Cozinhe pelo tempo indicado pelo fabricante.

5. Enquanto a massa cozinha, refogue bastante alho picado em azeite. Junte o brócolis e refogue também.

6. Escorra a massa e guarde 1/2 xícara da água do cozimento.

7. Coloque a massa na frigideira com o alho e o brócolis. Vá mexendo e acrescentando aos poucos a água do cozimento e parmesão ralado na hora, até formar um molho cremoso pela emulsão da água com o queijo e o amido da massa.

8. Salpique pimenta-do-reino e/ou pimenta vermelha (para meu filho, fiz sem esta última). Sirva imediatamente, com mais parmesão e azeite.

Para cozinhar mais:

Suflê de chuchu, meu chuchuzinho

Suflê de chuchu - O Caderno de Receitas

Este é um daqueles pratos com gosto de rotina, no bom sentido. Lembra conforto de jantar em casa, aquela hora em que o dia assenta e, com sorte, restam prazeres simples: a companhia escolhida (nós mesmos, talvez), calor, bom tempero. Ver o mundo é preciso, voltar para o ninho também – no meu, tem lugar especial esta receita em que o chuchu se transforma em um monte fofo saboroso, a quilômetros de distância da fama de sem graça.

Viva as viagens por ingredientes desconhecidos, viva o chuchuzinho de segunda-feira.

Teste número 79: suflê de chuchu
Fonte – Caderno de receitas da minha mãe.
Grau de dificuldade – fácil.
Resultado – Um sabor da minha infância que passei com gosto para a do meu filho.

Ingredientes
3 ou 4 chuchus
Sal
3 ovos (gemas e claras separadas)
Parmesão
Salsinha
Cebolinha
1 colher (sopa) bem cheia de manteiga
2 colheres (sopa) de amido de milho
1 colher (sopa) de farinha de trigo (ou o quanto bastar)

Modo de preparo
Cozinhe os chuchus em água e sal, sem a casca nem a parte do centro, depois escorra bem e amasse com um garfo.

Misture o chuchu, as gemas, bastante parmesão ralado na hora, salsinha e cebolinha picadas e a manteiga. Junte o amido de milho, depois a farinha, até atingir a consistência de massa mole.

Bata as claras em neve e junte delicadamente à massa misturando com uma espátula, sem mexer demais para preservar a leveza.

Despeje em uma forma untada e enfarinhada, sem encher demais porque o suflê cresce bem.

Leve ao forno pré-aquecido a 220 graus Celsius e asse até dourar. Evite abrir o forno durante o cozimento pois isso pode fazer o suflê murchar.

Para cozinhar mais:

Alcachofra recheada — para desbravar com as mãos e lembrar do mar

Alcachofra recheada

Por Lucila Mantovani*

Eu não me lembro muito bem quando minha avó me ensinou a fazer este prato, mas lembro de eu e meus irmãos engordurados comendo alcachofra e amando tirar aqueles pelinhos para abocanhar a surpresa que viria embaixo… Como aquelas histórias budistas que dizem que do lodo sai a flor mais bonita, sabe? É a vitória-regia, né? É ela que sai do lodo, eu acho. Gosto desse formato de flor que a alcachofra tem, mas que ao mesmo tempo não é delicada, e sim selvagem. Talvez então não tenha sido por acaso, pensando agora, o fato de, ao descascar o caule da alcachofra para fazer o recheio, ter me lembrado do Valdely Kinupp chegando no Instituto de Pesquisa da Amazônia com um saco de palmito de vitória-régia, para nos dar uma aula de Panc — Plantas alimentícias não convencionais. Talvez fosse a semelhança com a vitória-régia — uma analogia que eu fiz na infância — que guiasse minha memória. Agora, voltando à minha avó, me lembro do livro de receita que contém esta aqui, estou com ele em mãos escrevendo este texto. Se chama A Alegria de Cozinhar, 24ª edição — está todo aos pedaços, como ela, que já não consegue nem ficar de pé sozinha mas que continua preocupada em agradar e cuidar de todos. Ou como as alcachofras que insistiam em virar dentro da panela hoje. Não faz muito tempo que ela fez questão que esse livro voltasse para as minhas mãos. Eu havia levado ele ao Canadá comigo quando me casei, mas devolvi a ela quando me separei. Para minha avó, cozinhar é uma forma de amar. Pra mim, é também uma alquimia, magia, ritual. Hoje por exemplo fiz essa receita para tentar me curar de uma gripe e como uma forma de retribuir o carinho que recebi da minha mãe, que passou um tempo morando aqui comigo, fechando um ciclo. Agora, para além do gosto único da alcachofra, gosto mesmo é desta coisa de desbravar a comida com as mãos. E do pretexto pra ingerir um pouco mais de sal, já que vivo longe do mar.

Hoje fiz essa receita para tentar me curar de uma gripe e como uma forma de retribuir o carinho que recebi da minha mãe, que passou um tempo morando aqui comigo, fechando um ciclo”

Ingredientes
Azeite
Alho
2 alcachofras com cabo
1 tomate picado
Azeitonas pretas
Alcaparras
Cheiro-verde
Pimenta-do-reino
Sal
Queijo ralado
3 miolos de pão
Limão

Modo de preparo
Misture tudo numa frigideira  com azeite, começando pelo alho e pelos pedacinhos picados de alcachofra (retirados de dentro do caule). Depois adicione tomate, azeitona, alcaparra, cheiro verde, pimenta, sal, queijo ralado e pão picado. Misture até formar uma pasta/massa.

Abra as pétalas da alcachofra e preencha o espaço no meio com esse recheio.

Posicione as alcachofras em uma panela de forma que fiquem de pé, então encha a panela de água com limão, sal e azeite até cobrir o miolo, mas não chegar à parte que está com o recheio, na superfície. Tampe e deixe cozinhar… O vapor vai fazer o recheio ficar ainda mais coeso e saboroso.

Está pronta quando as pétalas se soltarem com facilidade quando puxadas.

* Lucila é água-lindoiense, caipira. Formada em economia, mas seus afluentes a levaram para as artes. Acabou desembocando na escrita, que acredita ser o seu lugar de criação. É uma das integrantes do Coletivo Ágata.


Para cozinhar mais: