Huminta (bolinho de milho e quejo) da Comedoria Gonzales

Foi com a mãe que o chef Checho Gonzales aprendeu a adaptar a cozinha andina aos ingredientes brasileiros. A família saiu de La Paz quando ele tinha sete anos e manteve por aqui costumes como o de parar à tarde para tomar café e comer huminta — uma espécie de pamonha boliviana. O milho daqui não é o mesmo, o queijo não é o mesmo, mas o ritual marcou a memória do menino que hoje serve a receita na Comedoria Gonzales, no Mercado de Pinheiros, em São Paulo.

Provei a huminta depois de receber a dica de uma amiga e leitora do blog. Na verdade, o que ela mandou foi mais um pedido desesperado: “Meu filho ama as humintas do Checo. São incríveis. Milho. Queijo. Vida. Fiquei pensando se você por acaso sabe que receita é essa.”

Eu não sabia, e fiquei louca para saber. Anos atrás publiquei um post sobre humita cremosa, preparada por um chef argentino, mas a huminta do Checho era outra história. Então fui correndo atrás dele, que já tinha contribuído para o blog antes, falando do rollo de queijo feito pela mãe, Maria Tereza.

A huminta também veio de Maria Tereza, mas foi adaptada para a Comedoria. Na receita dela, a massa ia ao forno em um tabuleiro, depois era cortada em pedaços. No restaurante, Checho preferiu assar porções individuais: o resultado são bolinhos de milho úmidos e macios, recheados de queijo derretido e salpicados de sementes de coentro. Vão bem com café ou como acompanhamento dos ceviches que o chef serve no Mercado de Pinheiros. (Já nas ruas de La Paz, as cholas — mulheres de raízes indígenas — costumam vender huminta cozida e embrulhada em folha de milho como a nossa pamonha.)

As voltas que o mundo dá. Maria Tereza, que tanto influencia a comida do filho, não gostava de cozinhar. “Era uma obrigação, e ela sempre odiou, achava cansativo. Às 6h, 7h da manhã, já estava na cozinha”, lembra Checho. Com o tempo, no entanto, essa relação mudou, e os pratos favoritos do filho, como falso conejo (“falso coelho”: bife de boi empanado, servido com molho e ervilhas) e chairo (sopa de carne e vegetais, incluindo batata desidratada), assumiram sua força de conexão. “Hoje minha mãe cativa através da comida.”

A relação de Checho com as heranças culinárias também se transformou. Ele entrou na cozinha profissional meio por acaso; foi o emprego que apareceu. Nos anos 1990, voltando de uma temporada na Espanha, fez comida mexicana, virou sócio de bar, abriu restaurante. Como praticamente todo chef ou aspirante a chef no Brasil na época, se guiava pelas culinárias francesa e italiana. Foi Alex Atala que o aconselhou a se jogar na latinidade. “Todo mundo queria ser francês, todo mundo queria ser Paul Bocuse e Joël Robuchon”, diz Checho. “Isso até entender que a própria identidade poderia ser muito mais rica.”

Está aí a huminta (e estão também as filas na Comedoria Gonzales) para provar o acerto da mudança de rumo.

Huminta (bolinho de milho e quejo) da Comedoria Gonzales

RECEITA

Huminta da Comedoria Gonzales

Rendimento: 50 bolinhos

Ingredientes*
1920 gramas de milho debulhado
375 gramas (3 xícaras) de farinha de trigo
6 ovos
360 gramas de manteiga
6 gramas (2 colheres de chá) de colorau
12 gramas (½ colher de sopa) de sal
45 gramas (2 ½ colheres de sopa) de fermento em pó
720 gramas de queijo (Checho mistura meia-cura com queijo fresco)
Sementes de coentro
*Como o restaurante trabalha com ficha técnica e medidas exatas, coloquei entre parênteses quantidades aproximadas em medidas mais caseiras. Minha sugestão: se não quiser fazer 50 bolinhos — é bolinho à beça —, divida todas as quantidades por dois ou três.  

Modo de preparo
Triture o milho no liquidificador.

Bata todos os ingredientes, exceto as sementes de coentro.

Distribua a massa em forminhas de papel (como as próprias para cupcake). Salpique as sementes de coentro por cima.

Leve ao forno pré-aquecido. Asse a 180ºC por 15 minutos.

Checho na Comedoria Gonzales (Foto: Lucas Terribili)
Checho na Comedoria Gonzales, no Mercado de Pinheiros (foto: Lucas Terribili)

Para ler e cozinhar mais:

2 Comments on Huminta: a pamonha boliviana que Checho Gonzales aprendeu a fazer com a mãe

  1. Olá! Adorei conhecer o teu espaço. Fiquei encantada com absolutamente tudo, modo de escrever, receitas, fotos. Gosto das histórias, saber das pessoas que convivem com as panelas, um reino para mim muito interessante e encantador. Parabéns!
    O Checho é um monstro sagrado na sua simplicidade, me comove cada sabor que explode na boca, quando provo dos seus pratos. Merecedor de um bravo, bravíssimo!
    Um abraço afetuoso e desde já, agradeço por partilhas deliciosas.

    • Oi, Maria Glória,

      Muito obrigada pela sua mensagem. Em volta da mesa criamos e contamos histórias, e é isso que eu tento fazer aqui, com a ajuda do Checho e de outros cozinheiros generosos.
      Fico feliz que você esteja gostando, espero que volte sempre.

      Grande abraço!

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