Categoria: Histórias e receitas

Histórias e receitas: da minha família ou da sua, de chefs de cozinha, de cozinheiros amadores e de todo mundo que tem uma boa lembrança de comida.

Metade desastre, metade delícia: cajuzinho de amendoim

O segundo docinho do aniversário do meu filho quase não entra no blog porque quase não entra na festinha. Mas, como salvei metade da panela (o resto virou um cimento grudado no fundo) e o gosto estava bom, tomei coragem para dar a receita aqui. Pretendo aprimorá-la em um próxima execução, então, se você tiver alguma dica, por favor deixe nos comentários.

O quase fracasso começou a se delinear ainda antes de eu colocar a mão na massa, na escolha do docinho de amendoim que eu iria preparar. O caderno de receitas da minha mãe tinha uma versão bem simples, com leite condensado, mas eu achei que essa era para fracos. Optei por outra, que levava açúcar, manteiga, chocolate em pó e ovos, e tinha a mais sucinta das preparações: misture e faça os cajuzinhos.

Leva ovo cru e não vai ao fogo? Liguei para a minha mãe. Ela já não se lembrava da receita. “Há tanto tempo não faço uma festa infantil…”, disse. “Mas você não vai servir ovo cru para as crianças, né?” Então tá. Coloquei a mistura em uma panela no fogão, fui mexendo e em alguns minutos percebi que a massa estava compacta demais, até difícil de virar com a colher. Pensei em acrescentar leite para dissolver, mas resolvi insistir nos ingredientes originais. Em compensação, pus metade do açúcar recomendado.

Errei. Da próxima vez vou colocar algum líquido na receita. E talvez mais açúcar para dar liga. Porque, depois de ficar na geladeira, a parte do fundo da panela tinha virado uma pedra. Em cima da hora da festa, enrolamos docinhos com a parte superior, que estava com um ótimo sabor de amendoim e chocolate.

A seguir, dou a receita original e falo das adaptações. Se você gosta de aprender com os erros dos outros, vá em frente.

Ingredientes
½ quilo de amendoim torrado e moído (ou batido no processador, como eu fiz)
½ quilo de açúcar (eu usei menos, mas isso pode ter afetado a textura do doce)
½ colher de sopa de manteiga
1 pires de chocolate em pó (calculei que um pires era mais um ou menos uma xícara e segui essa medida. Também substituí o chocolate por um cacau em pó orgânico que eu tinha na despensa)
3 ovos

Modo de preparo
O original só dizia para misturar. Seguindo meu instinto e instruções da minha mãe, levei ao fogo médio e fui mexendo por uns 20 minutos. Depois, mantive refrigerado até a hora de fazer bolinhas e colocar em formas de papel.

 

Tacu-tacu e lomo saltado: feijão com arroz e picadinho peruanos

Tacu-tacu e lomo saltado: cozinha peruana para variar o trivial brasileiro (foto: O Caderno de Receitas)
Tacu-tacu e lomo saltado: cozinha peruana para variar o trivial brasileiro

Tacu-tacu é a versão peruana do nosso feijão com arroz. Basicamente, consiste em uma massa feita com os dois grãos misturados e frita como uma omelete para ficar sequinha por fora e suculenta por dentro. Basicamente, porque as variações a partir dessa premissa tendem ao infinito, assim como as possibilidades de temperos, texturas e montagens do feijão com arroz brasileiro. Cada casa faz de um jeito, e o da nossa mãe é sempre o melhor.

Quando me enviou por email sua receita de tacu-tacu, o chef peruano Christian Báscones Cavero, do restaurante Huaco, de São Paulo, esqueceu de contar que, na casa da mãe dele, o toque especial do prato ficava por conta do acréscimo de um pouco de caldo de frango ou legumes. Esse segredo de família ele só compartilhou depois, quando conversamos por telefone.

O chef Christian Báscones, que veio ao Brasil para um campeonato de muay-thai e acabou ficando (foto: divulgação)

Com a mãe, ele aprendeu também o improviso e a política de desperdício mínimo na cozinha. “Ela fazia maravilhas com uma despensa que não tinha nada…”, lembra Christian. “O tacu-tacu é bem isso: você pode colocar lentilha no lugar do feijão e abóbora ou grão-de-bico no lugar do arroz.” Na falta de pimenta amarela peruana, ele sugere usar a brasileira biquinho – substituir, não substitui, mas fazer a gente joga com o que tem, né?

“Temos mais de 120 tipos de pimenta. Em um prato, cozinhamos com 5 ou 6 diferentes”, diz o chef, nostálgico. Mais saudade ainda ele sente do pescado do Pacífico – difícil reproduzir um ceviche como o servido em Lima com o peixe fresco disponível em São Paulo. Em compensação, desde que desembarcou no Brasil há 6 anos para participar de um campeonato de muay-thai, recebeu uma proposta de trabalho em um restaurante e acabou ficando, Christian descobriu os prazeres da farofa, da pimenta-de-cheiro, do requeijão e do pequi.

Se ele pode brincar de servir ceviche com arroz de pequi, a gente também pode variar o picadinho com arroz e feijão do dia-a-dia pelos primos peruanos lomo saltado e tacu-tacu.

Para acompanhar o prato, pisco sour de maracujá em vez de caipirinha (foto: O Caderno de Receitas)
Para acompanhar o prato, pisco sour de maracujá em vez de caipirinha 

Tacu-tacu
(para duas pessoas)

Ingredientes do tacu-tacu
150 g de feijão cozido
150 g de feijão cozido processado
300 de arroz cozido
1 colher de sopa de pasta de aji amarillo (pimenta amarela peruana) ou de pimenta biquinho*
1 colher de chá de orégano
1 colher de café de cominho
Sal e pimenta-do-reino a gosto
Caldo de frango ou vegetais (cerca de 125 ml, o o suficiente para a massa ficar úmida, mas não molenga)
Óleo para fritar

*Para fazer a pasta, abra as pimentas e descarte as sementes (isso não é necessário com a biquinho). Coloque as pimentas em uma panela com água fria, deixe ferver por um ou dois minutos e então descarte a água (se usar o aji, repita o processo três vezes). Liquidifique as pimentas e passe a pasta por uma peneira fina.

Modo de preparo do tacu-tacu
Misture todos os ingredientes e faça uma massa. Em uma frigideira de teflon quente, adicione óleo. Divida a massa em dois pedaços e dê formato de omelete a cada um deles. Deixe tostar de um lado, vire com cuidado e toste outro lado. Reserve.

Lomo saltado
(para duas pessoas)

Ingredientes do lomo saltado
300 g de filé mignon em cubos de 2 cm
Sal e pimenta-do-reino a gosto
60 g de cebola roxa em pétalas
1 dente de alho picado
1 colher de chá de gengibre picado
1 colher de sopa de cebolinha picada (com as partes brancas e verdes separadas)
2 tomates cortados em 4
1 pimenta dedo-de-moça picada
40 ml de shoyu
1 colher de sobremesa de molho de ostra
100 ml de caldo de carne
Amido diluído em água para engrossar
1 colher de chá de coentro picado
Óleo para saltear

Modo de preparo do lomo saltado
Em uma panela wok ou uma frigideira muito quente, adicione o filé mignon temperado com sal e pimenta-do-reino e sele bem um lado. Adicione a cebola, o alho, o gengibre e a parte branca da cebolinha picada. Salteie. Adicione o tomate e a pimenta dedo-de-moça e salteie mais. Acrescente os líquidos e engrosse com o amido. Finalize com o coentro e o resto das cebolinhas picadas.

Montagem
No prato, coloque o tacu-tacu e, sobre ele, o lomo saltado, despejando por cima o molho restante. Se quiser, decore com pimenta dedo-de-moça, coentro e cebolinha picados e sirva com ovo de codorna e banana fritos. Polvilhe páprica doce por cima.

Leia também: como fazer frijoles refritos (pasta de feijão mexicana)

Se estiver no Huaco e sobrar espaço para a sobremesa, mergulhe no açúcar do suspiro com creme de limão e frutas vermelhas (Foto: O Caderno de Receitas)
Se estiver no Huaco e sobrar espaço para a sobremesa, mergulhe no açúcar do suspiro com creme de limão e frutas vermelhas


Para cozinhar mais:

Abacaxizinho: doce de festa nas versões fácil ou quebra-coco

Um exército de abacaxizinhos: doces para quem gosta de doce

Quando deu 9 horas da noite de sábado, eu me joguei no sofá exausta como se tivesse dançado a noite toda. Ou como se tivesse enrolado dezenas de docinhos, decorado um salão, cuidado de uma criança de 2 anos (que se divertiu demais, mas caiu e machucou a boca em um momento de distração), recebido convidados. Em outras palavras, eu organizei uma festa infantil pela primeira vez e sobrevivi. Até gostei. Mas não tinha o menor pique para publicar nenhuma receita neste blog no fim de semana.

Agora, passados o cansaço e a agitação, vou começar a contar o que eu preparei para a festinha. Foi tudo muito simples (imagina se tivesse sido complicado!), meio à moda antiga. Eu e meu marido fizemos o que demos conta: três tipos de docinhos e duas receitas salgadas (a de berinjela ao forno eu já publiquei aqui). O bolo, de brigadeiro, foi comprado, assim como um punhado de pães de queijo – havia duas receitas de pão de queijo para testar, mas não tive tempo.

O primeiro docinho a entrar na linha de produção foi o abacaxizinho. Parecia fácil, e de fato é, se você não seguir meu exemplo de tentar abrir e ralar um coco sem habilidade e ferramentas adequadas.

A receita do caderno da minha mãe pedia um coco ralado, então eu comprei um coco. Vi na internet exemplos de como abrir um coco com martelo, então eu comprei um martelo e dei com ele no coco. Até aí funcionou. A dificuldade veio depois, para remover a carne da casca. Raspei com colher, cortei com faca, enfiei chave de fenda (a caixa de ferramentas já estava aberta, né?). Aos poucos, consegui tirar a polpa em pedaços, não sem machucar as mãos, e a bati no liquidificador – ralador a essa altura do campeonato, nem pensar. Mais tarde, na hora de enrolar os docinhos, decidi trocar o açúcar cristal por coco ralado, e comprei a versão em saquinho sem hesitar.

Ingredientes
2 abacaxis descascados
1 coco ralado (se você não tiver ralador de coco nem for masoquista, pode comprar o coco em saquinho ou ralado na feira)
900 gramas de açúcar (parece muito, e é. Tentei fazer com 300 gramas e não deu liga, então encarei as calorias e joguei os 600 restantes. Ficou bom, mas doce doce)

Modo de fazer
Bati o abacaxi em pedaços no mixer (a receita original mandava passar no moedor de carne, mas eu não tenho um moedor de carne). Juntei o açúcar e o coco ralado. Coloquei tudo em uma panela em fogo médio e, como minha mãe tinha me avisado, a casa se encheu de um cheiro de abacaxi e coco sensacional. Fui mexendo até o doce começar a despregar do fundo da panela.

Quando a massa esfriou, fiz bolinhas e passei por coco ralado (em vez de açúcar cristal como recomendava o passo a passo).


Para cozinhar mais:

Berinjela ao forno em vez de friturinhas

berinjela
Berinjela à Tuti: para descomplicar a comida de festa

Fritura tem seu valor, quem sou para negar? Mas lambuza a cozinha e fica uma tristeza quando esfria e murcha. Sabe aquela bandeja cheia de coxinhas e risoles desbeiçados? Que dó… Na festa de 2 anos do meu filho, resolvi não assumir esse risco. Os salgados serão uma carne louca de porco, feita pelo meu marido, e uma berinjela assada, feita por mim a partir de uma receita tirada do caderno da minha mãe. Para acompanhar, pão comprado na padaria.

Cada convidado se serve como quiser. Sem complicação. Os dois pratos podem ser preparados com antecedência, então é uma coisa a menos para se preocupar no dia da festinha. Agradam porquívoros, vegetarianos ou onívoros. Podem ser servidos quentes ou frios. Se sobrarem, migram bem para outras refeições – como recheio de sanduíche, molho de macarrão, item principal ou acompanhamento de um jantar ou um almoço. E são difíceis de dar errado, basta ter paciência e alguma atenção para não deixar nada queimar.

Abaixo explico a preparação da berinjela, que minha mãe pegou de uma amiga da minha avó, a Tuti, conhecida por cozinhar bem e também por revender ótimos pães de mel apfelstrudel. A receita do porco eu ainda vou ver se meu marido, autor do Blog do Nogueira, topa passar. Torça por isso, porque ela também é muito boa.

Os ingredientes: picou, misturou e forno!
Os ingredientes: picou, misturou e forno!

Berinjela à Tuti

Ingredientes
4 berinjelas descascadas e cortadas em quadrados
4 dentes de alho amassados
3 pimentões vermelhos cortados em quadrados
750 gramas de cebolas picadas em pedaços grandes
½ copo de vinagre
1 copo de água
1 copo de azeite
Orégano
Sal
Pimenta-do-reino
Molho inglês

Modo de preparo
Coloquei todos os ingredientes em um tabuleiro. Assei em forno médio, mexendo de vez em quando, até eles ficarem macios e o líquido do fundo do tabuleiro ter evaporado. Isso levou umas duas horas.

Obs.: quando a berinjela já estava no forno, minha tia Elisa, que mora nos Estados Unidos, me mandou uma mensagem dizendo que geralmente coloca o vinagre depois de assar. Vou tentar isso de uma próxima vez. Ela também deu a dica de preparar com dois ou três dias de antecedência e ir ajustando o tempero ao longo desses dias.

Se os docinhos derem errado, pelo menos tenho um martelo

 Alguém conhece um método melhor para quebrar coco?

Voltei para casa, depois de férias já saudosas em Jericoacoara, no Ceará. Bem a tempo de preparar a festa de aniversário do Pedro. Quer dizer, espero que a tempo. No momento, minha cozinha está tomada por abacaxis, cocos, maçãs, limões, berinjelas, cebolas, sacos de açúcar, chocolate, farinha e amendoim. Tudo para preparar os doces e salgados que serão servidos na comemoração de dois anos do filhote (ou quase tudo, porque certamente esqueci de alguma coisa e terei que fazer a 47ª visita ao mercado do dia).

De alguma forma, a situação lembra os dias que antecediam as festinhas da minha infância. Mas não tenho ao meu redor o exército de parentes que, naquela época, ajudavam a enrolar docinhos e torcer para o bolo não solar. Por isso, antes de colocar a primeira berinjela da caponata no forno, resolvi respirar e escrever esse post.

Agora com licença que vou pegar o martelo (comprado meia hora atrás) para quebrar um coco seco pela primeira vez na vida.