Pedro na cozinha, três anos atrás – agora ele está com seis
Eu pretendia aproveitar o Dia das Crianças para dizer que a gente deve levar os filhos para a cozinha. Que é gostoso, que ensina um monte de coisas sobre o mundo, que ajuda a comer melhor. Continuo achando tudo isso. Mas lembrei que aqui em casa estamos passando por uma turbulência nessa área. E resolvi compartilhar.
Começou com uma atividade de culinária na escola do Pedro, meu filho. As crianças, que andam encantadas com histórias de castelos, foram convidadas a preparar um banquete real.
Dois dias antes fui lá preparar os biscoitos de gengibre que seriam parte da festa. Aproveitei para falar à turma sobre as rotas das especiarias e sobre como, no século 16, a rainha Elizabeth 1ª gostava de bolinhos aromáticos que imitavam figuras da corte – eles seriam possíveis antecessores dos biscoitos de gengibre com formato de gente.
Contei também a fábula do boneco biscoito de gengibre, que escapa de um menino, dos pais dele, de homens na estrada, do urso, e corre, corre, corre… Até parar na boca da raposa. Ao meu redor, olhos infantis arregalados e silêncio. “Era só um biscoito, pessoal…” E seguimos em frente, preparando a massa e depois moldando os biscoitinhos que todos provamos com chá.
Chegou então a manhã do banquete. Pedro, encarregado das batatas, foi todo animado. Voltou sombrio, impressionadíssimo com a preparo do frango. Que nojo, comentava.
Alguns dias depois, servi frango assado. E meu filho, que sempre gostou de comer coxa de frango com as mãos (do mesmo jeito que come “arvorezinhas” de brócolis), entortou a boca para reclamar: “Ai, com osso…”. Separei a carne do osso, devolvi ao prato. Mas ele acabou não comendo.
Passaram-se mais alguns dias, panquecas recheadas de frango foram aprovadas, a calmaria parecia se aproximar. Então ouço um grito. Remexendo em revistas, Pedro encontrou isto:
A imagem entrou para a categoria das coisas que dão muito medo, junto com olhos de zumbis e um jogo do mico em que o macaquinho segura uma banana de dinamite. Consequentemente, o frango comida perdeu espaço no prato.
Não quero forçar nada. Mas também não quero ver a carne se tornar o novo cogumelo – que o Pedro amava até um dia engasgar com um e passar a recusar todos.
Resolvi argumentar. Me vi falando de cadeia alimentar (e imaginando o arrepio dos meus amigos vegetarianos), conversando sobre o que o assustou na cena da escola, prometendo que não iria preparar frango na frente dele (e me sentindo estranhamente mais perto da turma que protestou quando o Rodrigo Hilbert abateu uma ovelha na TV).
Outro dia Pedro voltou a comer frango, meio com vontade, meio desconfiado. A ver no que vai dar.
Ainda acho que cozinha é lugar de criança – acompanhada de um adulto, com segurança e tal. E ainda acho que conhecer o que vai à mesa ajuda a comer bem.
Mas as receitas nem sempre saem como a gente imagina.
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