O que é moderno e o que é antigo? Nos cadernos de receita da minha avó, pão se fazia com fermento biológico de pacotinho ou fermento químico. Bacana era o pão de minuto: prático, de preferência batido à máquina ou no liquidificador e composto por ingredientes comprados nos mercados pegue-e-pague da vida. Já para os padeiros influencers de redes sociais que abundam hoje em dia, pão de respeito se prepara longamente, com fermento criado, alimentado e fartamente fotografado em casa — mais ou menos como fariam nossos antepassados milênios atrás, se naquela época existisse Instagram.
Enquanto donas-de-casa de meados do século 20 se empolgavam com a possibilidade de preparar massas rápidas e fofas, esses novos cozinheiros perseguem um pão camponês rústico, cascudo, de miolo perfurado por alvéolos (bolhas) irregulares e sabor desenvolvido lentamente. Um sonho: o pão de Chad Robertson, da padaria Tartine, de São Francisco (EUA), com seu método que envolve extensões e dobras da massa para desenvolver a rede de glúten (detalhado no livro Tartine Bread).
Nunca comi o pão Tartine original, mas tenho me dado bem com uma versão da versão da receita. Explico: faço, com variações, o recomendado no vídeo Tartine for dummies (em português, algo como Tartine para bobos), apresentado a mim por Nana Caetano, que dá aulas de pão artesanal no seu gostoso apartamento térreo paulistano, apelidado de Pequeno Sítio.
Comparado aos pães de minuto da minha avó, este pão a princípio parecia uma maratona da panificação. Mas, na verdade, nesta versão simplificada ele só exige um pouco de organização, uma balança para medir os ingredientes e uma panela de ferro ou barro (ou de outro material que retenha bem o calor e aguente o forno). Ah, exige também certo muque na hora de cortar as fatias.
Ingredientes
200 gramas de fermento natural (veja aqui como fazer seu fermento natural)*
400 gramas de água
200 gramas de farinha de trigo integral
400 gramas de farinha de trigo branco
10 gramas de sal
*Cerca de 12 horas antes de começar a fazer o pão, ative seu fermento: misture uma colher de sopa do fermento a 100 gramas de farinha e 100 gramas de água. Espere que esteja bem borbulhante para usá-lo – nesse estágio, se você jogar uma colherinha dele na água, a pelota de massa deve boiar.
Modo de preparo
Dissolva o fermento em 360 gramas de água, depois adicione a farinha. Amasse com as mãos até que esteja tudo misturado. Espere 15 minutos.
Junte os 40 gramas restantes de água e o sal e misture. Aguarde mais 15 minutos.
Estique e dobre a massa conforme os movimentos abaixo:
Espere 10 minutos.
Repita os movimentos do passo anterior até completar cinco séries de dobras, respeitando os intervalos de 10 minutos. A massa vai mudar de textura e ficar bem menos grudenta.
Deixe a tigela tampada na geladeira por 12 a 36 horas.
Disponha a massa sobre uma superfície enfarinhada e espere 15 minutos.
Dobre a massa, depois molde uma bola, conforme os movimentos abaixo:
Transfira a massa para uma cesta ou outro recipiente que vai manter o formato circular (eu tenho usado um chapéu coberto por um pano de prato polvilhado com bastante farinha).
Cubra a massa com o pano. Deixe-a por uma a quatro horas em temperatura ambiente ou por até 24 horas na geladeira.
Antes de assar o pão, coloque a panela e sua tampa dentro do forno ligado no máximo e deixe que esquentem por 30 minutos.
Os próximos passos têm que ser rápidos. Vire a massa sobre uma pá ou uma tábua enfarinhada. Faça cortes superficiais na massa, usando um estilete ou uma lâmina própria para isso (eu tenho feito cortes em cruz). Com cuidado e boas luvas, abra o forno, deslize o pão da pá para a panela e tampe-a. Baixe a temperatura do forno para 230ºC.
Asse a massa com tampa por 30 minutos, então destampe a panela e asse mais 20 minutos ou até formar uma crosta dourada. Quando estiver pronto, batidas no fundo do pão emitirão um som oco.
Deixe o pão esfriar sobre uma grade.
Para cozinhar mais: