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Beterraba — um ingrediente, três versões

“A coisa mais notável sobre minha mãe é que por 30 anos ela serviu à família apenas sobras. A refeição original nunca foi encontrada.”
Calvin Trillin

Família pequena tem dessas coisas: você cozinha um ingrediente e, se bobear, passa os próximos dias comendo a mesma coisa, até enjoar. Claro, dependendo do que for, você pode congelar uma parte para consumir depois. Ou apelar para a velha sabedoria materna de aproveitamento: a sobra do almoço migra para o jantar, o resto do jantar dá as caras no almoço de amanhã e o almoço de amanhã… Bom, você sabe.

Para não pegar raiva do coitado do ingrediente repetido, vale criar variações. Hoje dou algumas sugestões para a beterraba. Tudo comida do dia-a-dia, para comer com gosto e sem complicação.

– Um acompanhamento básico (ou dois)
Frango ao tandoori com beterraba cozida e arroz

Refeição de dia de semana, sem tempo para gastar na cozinha. O prato principal foi um frango assado com limão, alho e tempero tandoori (tempero em pó indiano). Para acompanhar, beterraba cozida, ainda quentinha, com azeite, limão e sal.

Pois é, é só lavar, cozinhar em água, depois tirar a casca com as mãos, então fatiar e temperar já no prato. Quase tão fácil quanto fazer miojo.

As folhas também podem ser aproveitadas como salada. (Aliás, sabia que a humanidade começou comendo as folhas, e não a raiz da beterraba?)

– Uma salada com ovo e peixe em conserva
Salada de beterraba, ovo e dourada em conserva

A beterraba já cozida, mas não temperada, vira fácil uma salada com ovo e atum que pode ser tanto acompanhamento como recheio de sanduíche ou um prato principal frugal.

Outro prato fácil como miojo, mas bem melhor.

Faça assim:

1 – Cozinhe um ovo: deixe a água ferver, coloque ovo dentro com cuidado, conte 11 minutos então o transfira para uma tigela com água gelada para parar o cozimento antes de descascar.

2 – Corte a beterraba em cubos (se quiser uma salada morna, aqueça a beterraba primeiro).

3 – Em uma tigela, misture o ovo em pedaços, a beterraba, atum ou outro peixe enlatado (ficou ótimo com uma conserva portuguesa de dourada), azeite, sal e pimenta-do-reino. Mexa até o ovo e o azeite formarem uma liga cremosa.

– Uma sopa
sopa russa de beterraba com creme

A receita da sopa de beterraba russa veio do caderno da minha tia Olympia, de que já falei aqui. Existem versões mais elaboradas, com beterraba fermentada, smetana (creme de leite azedo; confira no post sobre estrogonofe) e adição de outros vegetais, como cenoura e batata.

Eu segui as instruções da receita familiar, bem fácil, alterando um pouco as quantidades e trocando farinha de arroz por amido de milho. Para fazer o caldo, cozinhei em água ossos de frango assado e sobras de vegetais (ponta e casca de cebola e alho, aparas de cenoura, talos de couve, ervas como cebolinha e alecrim) congelados; juntei também parte da água do cozimento da beterraba.

Ingredientes
3 beterrabas grandes cozidas e descascadas
½ colher de manteiga
2 litros de caldo de carne ou frango (ver parágrafo acima)
2 colheres (sopa) de amido de milho
Sal
Pimenta
Dill
Para acompanhar: creme de leite fresco com algumas gotas de limão ou smetana (leia mais aqui)

Modo de preparo
1. Processe a beterraba quente passando em um passador de legumes ou batendo no liquidificador.  Misture com a manteiga.

2. Leve o caldo para ferver e apurar. Engrosse misturando amido de milho.

3. Junte a beterraba ao caldo e deixe ferver (a consistência da sopa é líquida, com pedacinhos da raiz peneirada).

4. Acerte sal e pimenta.

5. Sirva com dill e creme de leite à parte.

O suco da vida

Roberta (de maiô branco), a mãe, Ana Maria, e a irmã, Polyana
Roberta (de maiô branco), a mãe, Ana Maria, e a irmã, Polyana

Este relato faz parte de uma série de depoimentos sobre as delícias e as histórias da cozinha de mãe

Por Roberta Dalbuquerque*

Minhas lembranças de menina quase todas envolvem a minha mãe e a doçura com que sempre tratou os assuntos da cozinha. Me alegra pensar na forma carinhosa com que ela conduzia as refeições. Ana Maria nunca teve medo de trabalho. E, apesar de passar muitas horas em consultórios e hospitais, fazia absoluta questão de almoçar todos os dias em casa conosco. Enfeitar a mesa, tirar a louça de festa num dia qualquer, deixar as crianças usarem as taças de cristal para tomar vitamina C.

Inventava pequenos mimos para deixar nossa vida mais leve. Dava nomes para os pratos que servia. Quando acabava o requeijão, ela misturava manteiga e queijo ralado e anunciava contente que hoje comeríamos pão com a sua especialidade francesa: o queijo La Marie. Em dias de aniversário, quem completava anos tinha direito de escolher o cardápio do almoço de toda a casa (inclusive o dos adultos). Era incrível! Nas semanas de provas, fazia arranjinhos de flores para enfeitar o lugar das crianças amedrontadas pela matemática ou por qualquer qualquer outra matéria. Até hoje, deixa bilhetinhos sob os pratos e pergunta animada: “Alguém achou alguma coisa embaixo do prato?!”.

Das receitas com nome, lembro especialmente do suco da vida. Era o terror das crianças. De uns tempos pra cá, redescobri o suco e tenho feito com frequência. Muito antes de as blogueiras fitness nascerem, a danada já fazia suco funcional. E enquanto o bebíamos (com uma certa má vontade), ela descrevia tudo de maravilhoso que ele faria por nós. “Esse suco deixa o cabelo lindo e brilhoso, as unhas fortes, a pele boa, protege o corpo da gripe, ajuda a cabeça a aprender melhor.” Era quase milagroso.

Muito antes de as blogueiras fitness nascerem, a danada já fazia suco funcional. E enquanto o bebíamos (com uma certa má vontade), ela descrevia tudo de maravilhoso que ele faria por nós”

Nunca ofereci o suco da vida para as minhas filhas. Pensando bem, vou tentar. Quem sabe em uma taça de cristal?

Suco da vida

Ingredientes
2 laranjas
½ beterraba
½ cenoura
1 colher de mel
Um pouquinho de gengibre

Modo de preparo
Bata tudo no liquidificador e está pronto. Agora é só esperar cabelo, unhas, pele, corpo e cabeça obedecerem a Ana Maria.

*Roberta Dalbuquerque é autora do livro Quem Manda Aqui Sou Eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade (editora HarperCollins), criadora do site A Verdade É Que… e diretora de arte da revista Claudia.

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