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O mito da avó saudável

Nostalgia e açúcar: chá da tarde com bolo

Depois que me engajei na missão de cozinhar todos os pratos dos cadernos de receitas da minha mãe e da minha avó, passei a comer muito mais açúcar. Bolos, biscoitos e tortas nunca foram frequentes aqui em casa. Agora são. Se abro a despensa, dou de cara com leite condensado esperando para virar guloseima (eu não comprava tanto leite condensado desde a adolescência, quando, em tardes de fúria, era capaz de comer uma lata inteira, gelada, de colher).

Resolvi refazer a comida da minha família porque queria esmiuçar memórias. Mas logo fiquei abismada com a quantidade de açúcar, farinha branca e gordura das preparações e passei a questionar (mais) a ideia de que antigamente é que se comia direito. Envolta nessas experiências, entrevistei o escritor americano Michael Pollan, uma espécie de cruzado contra os alimentos industrializados e autor da máxima: “Não coma nada que sua avó não reconheceria como comida”. Quando perguntei se não exagerávamos no saudosismo em relação à cozinha de nossos antepassados, Pollan respondeu que às vezes sim, mas argumentou que hoje compramos doces prontos a qualquer hora, enquanto nossas avós os preparavam em ocasiões especiais.

Talvez a avó dele fosse assim. Na casa da minha avó materna, toda tarde tinha chá com bolo, rosca, biscoito, geleia. Sem faniquitos por causa de um ingrediente pouco saudável aqui ou ali, da cozinha dela saíam também assados com caldo de carne em tabletes, provavelmente transbordando de sódio. Margarina era uma opção, assim como leite condensado, apontado pelo crítico Dias Lopes, do Estadão, como “um produto que está descaracterizando a doçaria tradicional brasileira”. Ah, mas como era linda a gelatina fantasia, repleta de cubos coloridos!

As receitas da minha avó (e de muitas outras) talvez não passassem pelo crivo de um expert em gastronomia ou de um nutricionista. Para cozinhá-las hoje, pego leve no açúcar e substituo ingredientes. Mas eram gostosas, carregadas de história, e reuniam a família à mesa para criar novas histórias. Se a vida é mesmo curta, melhor caprichar no recheio. Minha avó caprichava.

* Publiquei este texto originalmente na revista L’Officiel. Lembrei dele enquanto me ocupava de mais um teste de pudim (receita em breve aqui no blog). Você sabe, a gente tem que provar todos os experimentos, né?

Coquetéis e Sinatra

Este é meu: drink Soulless Gentleman, com whiskey Gentleman Jack, maple syrup, limão siciliano, bitter e tintura de chá Lapsang Souchong
Este é meu: drink Soulless Gentleman, que leva whiskey Gentleman Jack, maple syrup, limão siciliano, bitter Truth Peach Bitters e tintura de chá Lapsang Souchong

Na minha lembrança, coisas extraordinárias acontecem no hotel Maksoud Plaza. Criança, eu perdia o fôlego diante daquele lobby infinito, com um elevador panorâmico que me levava a um nível de empolgação ao qual hoje vista nenhuma é capaz de me alçar. Anos mais tarde, repórter em começo de carreira, fui enviada lá para uma entrevista coletiva com uma dupla sertaneja, errei de porta e me surpreendi ao encontrar o ator Christopher Lambert, o eterno “Highlander”, que promovia um filme em São Paulo. Outros tantos anos se passaram e, em um fim de tarde entendiado, eu e meu marido resolvemos tomar um drink no hotel. Ingressamos em um túnel do tempo acarpetado e solitário — na ocasião, éramos os únicos clientes do bar. Foi divertido, mas minhas memórias (e as da cidade) mereciam mais.

Agora o bar do saguão do hotel ganha uma nova chance (assim como o topo do prédio, que desde janeiro abriga a balada PanAm). Para começar, muda de nome: de Batidas & Petiscos para Frank. É uma homenagem a Frank Sinatra, que se apresentou no teatro do Maksoud em 1981, em quatro shows para 700 pessoas precedidos por jantares — o cardápio, segundo a Folha de S.Paulo, listava “lagosta cozida com pouco sal; fundo de alcachofra com creme sofisticadamente rosado e gostoso; filé mignon com molho repleto de azeitonas sem caroço e alguns cogumelos; doce recheado de chantilly (tipo mil folhas)”. Outros tempos.

Inaugurado no fim de abril, o novo Frank conta com um nome de peso da coquetelaria em São Paulo: o premiado Spencer Jr., ex-Isola e MyNY. Conhecido por seu negroni envelhecido em barril de bálsamo, o bartender serve clássicos e criações próprias (entre elas, versões de martínis e o Soulless Gentleman: whiskey Gentleman Jack, maple syrup, limão siciliano, bitter e tintura de chá Lapsang Souchong). A conferir na próxima happy hour.

Serviço: o Frank Bar fica aberto todos os dias, das 18h às 2h, no lobby do Maksoud Plaza (alameda Campinas, 150, São Paulo – SP).

Publiquei este texto originalmente na coluna O Caderno de Receitas da revista L’Officiel Brasil. Em tempo: os coquetéis também podem ser engarrafados para viagem.

Receita da chef Paola Carosella: ameixas tostadas com amaretto e baunilha

Paola recomenda fazer as ameixas "com cariño e boas intenções" (foto: divulgação / Jason Lowe)

Escrevi um perfil da chef argentina Paola Carosella para a edição de maio da revista L’Officiel. A entrevista aconteceu durante um almoço no café La Guapa da Livraria da Vila do bairro paulistano dos Jardins, e a conversa estava tão boa quanto as empanadas acompanhadas de salada e suco de hibisco.

Falamos de ingredientes frescos, viagens, ser jurada do reality show gastronômico MasterChef, lembranças de infância. Criança, Paola passava muito tempo com os avós, agricultores que se mudaram da Itália para a Argentina e plantavam, criavam animais e cozinhavam muito na periferia de Buenos Aires. “Na minha casa tinha coelho, porco, galinha, tomate, uva…”, lembra a chef. “Meu avô fazia azeite de oliva e vinho, que era horrível, e pescava, então tinha muito bicho o tempo inteiro.”

Era um estilo de vida muito diferente do que Paola leva hoje em São Paulo, se dividindo entre ser mãe e tocar um restaurante e dois cafés, além de projetos como o MasterChef e aulas de culinária. Para aumentar o contorcionismo no dia a dia, ela namora um fotógrafo inglês que mora em Londres, autor das imagens que ilustram a matéria da L’Officiel.

Mesmo em meio a essa correria, ela separou para a reportagem uma receita apetitosa como os assuntos de que tratamos. É a preparação desse prato que eu compartilho aqui, e destaco a recomendação da chef: deve ser feito “com cariño e boas intenções”.

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Ameixas tostadas com amaretto e baunilha

Ingredientes
400 g de ameixas frescas
1 fava de baunilha
3 colheres de sopa de açúcar mascavo
3 colheres de sopa de licor amaretto (ou suco de laranja se não quiser usar álcool)

Para servir
Creme de leite fresco batido sem açúcar ou iogurte grego ou sorvete de baunilha

Modo de preparo
Pré-aqueça o forno a 180 graus.

Lave e seque as ameixas.

Corte-as no meio (pode deixar o caroço que não sair facilmente).

Aqueça por 5 minutos uma travessa de louça ou vidro ou ferro dentro do forno.

Abra a fava de baunilha no centro, retire as sementes e coloque-as dentro de uma bacia junto com o açúcar e o amaretto.

Misture bem e coloque a fava aberta junto.

Acrescente as ameixas e misture com as mãos por um minuto com cariño e boas intenções. Coloque na forma pré-aquecida.

Leve ao forno por 10 minutos.

Retire e coloque num prato bonito as ameixas e tente resgatar a maior parte do suco que soltaram. Regue as ameixas com essa calda.

Ofereça o creme chantilly ou iogurte ou sorvete à parte. Pode acompanhar amêndoas torradas.

Rendimento: 4 porções.

(Fotos: divulgação / Jason Lowe)


Para cozinhar mais: